Eric
Tadeu Miguel
Universidade
Federal de São João Del-Rei
Email:
arcanjosmith@hotmail.com
Orientador: Professor Dr. José Luiz de Oliveira
Resumo: Este trabalho tem como objetivo
explicitar a relação governante e povo segundo as abordagens feitas por Nicolau
Maquiavel, no livro “O Príncipe”(1532). Analisando cada capítulo, obtêm-se uma base de explicação sólida e concisa para
se chegar a uma conclusão de como ocorre esta relação. A mesma acontece a
partir do momento em que o governante deixa clara a sua autoridade,
independente da maneira que ira fazê-lo, sendo uma relação de certa forma
opressiva, assim, esta relação ocorrerá por meio do medo imposto pelo
governante.
Palavras-chave:
Relação, Governante,
Povo, Perspectiva, “O Príncipe”, e Maquiavel.
La relación de gobierno y
personas en Perspectiva Maquiavelo
Resumen: Este artículo tiene por objeto aclarar la relación y las
personas que gobiernan de acuerdo con los planteamientos hechos por Nicolás
Maquiavelo en su libro "El Príncipe" (1532); el análisis de cada
capítulo, se obtiene una base de explicación sólida y concisa, para llegar a
una conclusión en cuanto a cómo se produce esta relación. Lo mismo ocurre desde
el momento de la sentencia deja claro su autoridad, independientemente de la
forma en que lo harán, al ser una relación, de alguna manera opresiva; por lo
tanto, esta relación se producirá a través del miedo impuesto por el gobernante.
Palabras
clave: relación; gobernante; Personas;
Perspectiva; "El Príncipe"; Maquiavelo.
The Governing Relationship and People in
Perspective Machiavelli
Abstract: This paper aims to clarify the relationship and
ruling people according to the settings made by Niccolo Machiavelli in his book
"The Prince", explaining each chapter has a sound basis and concise
explanation for reaching a conclusion as to how this relationship occurs. The
same happens from the moment the ruling makes clear its authority, independent
of the way they will do it, with a list of some oppressive form, so this
relationship will occur through the fear imposed by the ruler.
Keywords: Relationship, Ruler, People, Perspective, "The
Prince", and Machiavelli.
Considerações Iniciais
A obra realizada no século XVII, vem relatando a realidade de sua época em um
envolto marcado pela soberania e guerras. A política nada mais era que uma
conquista de um trono através do poder armado e organizado ou da pura e simples
ancestralidade, mas o que garantiria qualquer uma destas conquistas seria a
percepção do príncipe em relação ao modo de vida do povo, podendo através desse
trabalho explicitar a relação governante e povo que acontece através do mal
causado pelo mesmo para a manutenção de seu poder.
Características
do Governante
É preciso salientar que em termos
maquiavelianos, para o governante, tudo o que se refere à guerra está em seu
favor porque trata-se de situações que o faz mantê-lo no poder. O governante
representado na figura do príncipe preocupa-se com as armas, pois somente com
elas é possível a manutenção do poder. O soberano, uma vez não sabendo o que
faz, fica desacreditado de seus soldados. O que o verdadeiro governante faz na
perspectiva de Maquiavel é praticar a
arte da guerra, principalmente em tempos de paz por meio da ação, que além de
manter os soldados disciplinados, praticará exercícios que o fortificarão
fisicamente e também fará com que ele conheça bem o lugar que habita e suas
dominações. A arte da guerra praticada também em pensamento ajuda de uma
maneira incomensurável a fazer com que o governante pense em situações reais e
dessa forma, encontrar soluções para as mesmas nos tempos de guerra. Sobre isso,
ressalta Maquiavel (1452) :
Filopemenes,
príncipe dos Aqueus... nos temos de paz...pensar em coisa de guerra.Quando
passeava com os amigos... os interrogava: se os inimigos estivessem sobre
aquele monte, e não estivéssemos aqui, com nossos exércitos quem teria maiores
vantagens? Como se poderia ir ao seu encontro, observando a nossa formação? Se
nos quiséssemos retirar, como deveríamos fazer? Se eles se retirassem como
faríamos para segui-los? Enfim, formulava todas as hipóteses que podem ocorrer
em campanha, ouvia-lhes a opinião, dava a sua...de modo que quando estava a
frente dos exércitos, nunca surgiu um
acidente que ele já não tivesse previsto... (99)
Percebe-se que por meio de suas reflexões o
governante, através de suas reflexões sobre a arte da guerra, o governante
formula situações e ao mesmo tempo soluções para elas. Poderia ele garantir uma
probabilidade muito maior à sua vitória, por exercitar situações que poderiam
realmente acontecer. Na prática, o príncipe encontra soluções para a arte da
guerra em defesa, manutenção e vitória de seus exércitos. (Maquiavel, 1960).
Nessa reflexão, há também um fator muito
importante que se baseia no campo que seria da historicidade. Para Maquiavel(1452)
o soberano deve aprender com os exemplos de grandes homens. Este aprendizado é
em relação ao significado de prudência pois ela está justamente em “considerar
as ações de grandes homens, observar como se conduziram na guerra, examinar as
razões de suas vitórias e derrotas... (99). Desta forma , o governante ou o
príncipe pode avaliar as situações com ele ocorridas de uma forma sábia e toma
para si a práxis para saber lhe dar
melhor com as contingências.
Podemos dizer em outras palavras que uma
arte da guerra é estudar a história de grandes homens para que apreendendo
exemplos de conquista ele possa sempre estar sendo conduzido para a vitória. Ao
se referir ao louvor ou vituperidade ao príncipe ou governante, Maquiavel está
explicando a forma de como o mesmo deve se comportar com os súditos e seus
amigos. E para tal, usará a forma real de como o governante deve comportar-se e
não como deveria fazê-lo. Sobre isso Maquiavel (1960) afirma:
Vai tanta diferença entre
o como se vive e o modo por que se deveria viver, que quem se preocupar com o
que deveria fazer em vez do que se faz, aprende antes a ruína própria; e um
homem que quiser fazer profissão de bondade é natural que se arruíne entre
tantos que são maus (101)
Nota-se em sua abordagem, Maquiavel
evidencia que uma das atitudes do príncipe ou governante é estruturar seu modo
de vida no presente. O pensador da renascença realça a vida como ela é
realmente. Iludir-se em pensamentos sobre o modo de vida, seria um erro, pois o
governante cria algo que não existe. Nesse sentido percebe-se que uma das
características do governante é agir de forma contrária à bondade pois o mal
realizado seria válido quando necessário. Usar o mal dessa forma seria para a
manutenção do poder do soberano (101).
Mas o que faz um governante ser louvado ou
censurado são suas qualidades apresentadas diante das pessoas que se encontram
sob seu domínio. Para Maquiavel (1960) o governante pode ser explicitado das seguintes maneiras:
Isto é, alguns são todos como
liberais, outros como
miseráveis...alguns são tidos como pródigos, outros como rapaces; alguns
são cruéis e outros piedosos; perjuros ou leais;efeminados e pusilâmines ou
truculentos e animosos; humanitários ou soberbos; lascivos ou castos; estúpidos
ou astutos; enégicos ou indecisos, graves ou levianos;religiosos ou incrédulos,
e assim por diante (102).
Dessa forma, Maquiavel deixa claro que o que
compõe a reputação do príncipe são suas qualidades. Mas, a característica
principal para a manutenção do príncipe no poder seria a maldade, pois por meio
dela, o soberano pode garantir-se entre outras pessoas que também são más.
Contudo, para a realização da maldade e
para a manutenção de seu poder é preciso a prudência para que não haja exagero
em seus atos e todas as qualidades que ele possa construir, favoreceriam ao
governante para a continuidade de seu governo.
Para o pensador renascentista da política
algo seria deixado evidenciado “pode-se deixar que as coisas sigam seu curso
natural” porque como o príncipe é um ser humano, é preciso que ele seja
disciplinado para que saiba lhe dar de forma sábia com algum defeito que
possua.
Em sua
exposição, mais uma outra característica é ressaltada, segundo Maquiavel,
evitar ao máximo possível de gastos para que não tenha necessidade de tirar de
seus súditos. E também possuindo a parcimônia, o governante pode garantir a
defesa de seus domínios. Portanto, a característica de miserável acarrreta nos
súditos nem ódio e nem amor ao soberano, mas sua popularidade. Desta forma a
possibilidade de receita no reino seria bem maior e esta atitude seria
considerada prudente.
O
que é o povo na visão maquiaveliana
Na
época do filósofo italiano, o povo seria um conjunto da massa que deveria se sujeitar ou não de acordo com a forma de
conquista do principado. Para tal, é preciso uma estrutura política, militar e
religiosa bem organizada por parte do governante e todos que com ele colaboram
para sua manutenção no poder.
Pois o que caracteriza a união de um povo é justamente o poder que possui para fazer
permanecer ou não um príncipe no poder. Mas na época, muitos eram coagidos através do medo ou as pessoas
eram coagidas através da bondade, uma realização de ação que possibilitasse ao súdito ter uma
certa importância para a coroa.
O povo é o maior colaborador para ascensão ou declínio de um governo
independente de sua característica, seja
ele totalitário, absolutista, ou republicano, as massas sempre terão esse papel
de suma importância que seria a manutenção ou não de alguém no poder.
O
poder que se é adquirido é percebido pelo povo como algo positivo, pois só de
colocarmos que há uma determinada forma de governo, está afirmando-se que esse
povo não teria uma opção de escolha já que, não pode-se haver uma outra
possibilidade. Infelizmente deve-se realizar a vontade que é exposta pelo
soberano que é a de colocar toda a massa sobre seu controle.
Na verdade o que é mais preocupante dentro
deste contexto apresentado por Maquiavel, seria a passividade demonstrada por
todos aqueles que fazem parte de qualquer regime. Olhando com mais afinco as
observações de Maquiavel, pode-se de forma bem clara, observar que a
característica mais marcante em todo esse processo seria a falta de
esclarecimento pois, para época, o único
esclarecimento tido como verdadeiro era o esclarecimento exposto através da fé religiosa? Sendo qualquer atitude contrária a esse esclarecimento,
poderia significar a morte ou alguma outra atitude severa que poderia ser usada
como exemplo para desmotivar qualquer pessoa que for contrária ao soberano, na
época a igreja católica e governo
andavam de mão dadas, isso facilitaria muito no controle das massas.
A
educação era algo restrito ao povo;
afinal o soberano que representa Deus na terra não pode ser contrariado, a manutenção deste paradigma, prejudicou muito o desenvolvimento cognitivo das
massas, pelo fato do povo ser privado ao conhecimento, tanto que é
mais favorável tê-los como ignorantes do que proporcionar uma chance de
esclarecimento; o povo seria toda essa
massa e por mais que ocorram mudanças no governo, toda e qualquer ação será,
repito, para a manutenção do príncipe no poder, por mais querido ou odiado que ele seja,
mas para tal realização é preciso sempre a aprovação do povo, sem ela fica muito mais
difícil a obediência deste povo para com o soberano.
Mas se tratando em relação ao povo, o
comentador Newton Bignotto aponta no capítulo segundo de sua obra Maquiavel
Republicano que a questão da liberdade é algo que pode ser consideravelmente
importante, porém como a questão da liberdade esta ligada ao povo na visão do
comentador dentro da obra O Príncipe?
A
resposta seria simplesmente que; a liberdade para o povo dentro da visão maquiaveliana explicitada na obra de Newton Bingnotto,
seria o domínio do soberano sobre seu povo, ou seja, o povo nada mais é que a
expressão de grandeza do soberano, encontrando no domínio do mesmo a sua
liberdade.
Apesar de possuir elementos que pudessem
possibilitar a sua liberdade diante das imposições do príncipe, durante vários
séculos, o povo de certa forma sentiu
necessidade de estar sob domínio de alguém, e este só acontece por causa de transferência de
responsabilidade da maioria do povo para as mãos do soberano. Assim, na visão
de Maquiavel, o povo seria este aglomerado de pessoas que está para atender os desejos do soberano
apesar de que, o soberano só domina o principado de fato tendo o feito através
da força e de forma digna ganhando a admiração ou pela força de modo
hereditário ou através do medo.
Mas
na observação de Newton Bignotto, o povo é realmente livre de acordo com as
colocações e imposições do soberano, ou seja, o povo não está em sua terra para
ser livre de fato.
Como
acontece a relação entre governante e povo
Segundo
os dois tópicos anteriores, o primeiro explicita as características do
governante que seriam, na colocação maquiaveliana a prática da arte da guerra
em tempos de paz, formulando situações para encontrar soluções para elas,
aprender os exemplos dos grandes homens para que o príncipe saiba lhe dar
melhor com as situações, colocou também que é mais vantajoso ser mal do que bom
pelo fato de estar cercado de homens maus (101).
Um outro ponto importante apresentado no
primeiro tópico são as qualidades que ele possúi, por que através delas é que
se podem manter um príncipe no poder (Maquiavel, 1960), mas uma das
características que são primordias é a parcimônia que seria evitar gastos ao
máximo em seu principado, essa característica somente aumenta a popularidade do
Príncipe.
Já no segundo tópico que refere-se ao povo.
Pode-se colocar como significado que o povo é o conjunto de pessoas sob o
domínio do príncipe, porém para manter o povo sob seu controle, a educação
obviamente é algo restrito, justamente para que o povo não fosse capaz de
pensar por si só e dessa forma a liberdade do povo se encontra na opressão do
soberano como foi apresentado neste tópico.
O que explicitaremos nesta última parte será
como ocorre esta relação entre o governante e povo, a partir dos significados
de ambos, apresentados anteriormente na perspectiva maquiaveliana.
Podemos perceber que esta relação governante
e povo estará obviamente mais favorável ao governante devido as características
que possuem, como segue:
E, entre
todos os príncipes, os novos são os que menos podem fugir a fama de cruéis,
pois os Estados novos estão cheios de perigos(107)...portanto, crédulo o
príncipe e nem precipitado e não deve amendrontar-se a si próprio, e proceder
equilibradamente, com prudência e humanidade, de modo que a confiança demasiada
não o torne incauto e a desconfiança excessiva não o faça intolerável.(108).
Percebe-se que o governante apesar de todos
os perigos que o cercam, deve agir de forma equilibrada em tudo o que for
realizar para que dessa maneira, tenha uma relação harmoniosa com os súditos.
Mas para que tal relação possa se realizar,
qual a seria a melhor maneira do governante se comportar? Através da colocação
abaixo seja possível esclarecer tal questionamento:
Responder-se-á
que... é muito mais seguro ser temido que amado, quando se tenha que falar numa
das duas. É que os homens geralmente são ingratos, volúveis, simuladores
covardes e ambiciosos de dinheiro, e, enquanto lhes fizerem bem, todos estão
contigo... desde que a necessidade esteja longe de ti. Mas quando ela se a
vizinha,voltam-se para outra parte...Pois as amizades conquistadas por
interesse e não por grandeza de caráter, são compradas, mas não se pode contar
com elas no momento necessário.(108).
O
que ocorre de fato segundo as colocações de Maquiavel é que devido as
características que o homem possúi e de acordo com seu tempo, o comportamento
mais viável para a manutenção do príncipe no poder é que ele seja temido,
justamente por causa da maldade que a ele o cerca e dessa forma pode lidar
melhor com ela.
Afinal o que é explicitado pelo filósofo
florentino é que, o que ocorre entre o governante e o povo é justamente uma
relação de interesse, pois se alguém, no caso o príncipe, não puder atender aos
intentos dos súditos, não tem motivo sua manutenção no poder.
O que fica nitidamente claro é que
enquanto o governante puder atender os interesses de suas amizades, elas
estarão sempre com ele, mas o que é explicitado na posição maquiaveliana é que
as amizades devem ser conquistadas através do medo, para que assim elas atendam
aos desejos do governante em algum momento de desamparo.
Portanto o medo é algo importante nessa
relação. Se por ventura o príncipe não seja querido ou estimado o que deve ser
ressaltado com veemência é que, o ódio por parte dos súditos deve ser evitado,
pois sendo temido, se precisar tomar uma atitude mais drástica como derramar o
sangue de alguém, terá justificativa (Maquiavel,109).
Na relação entre ambos, a palavra é algo de
grande relevância juntamente com a força, porém é preciso saber como
empregá-las para que assim dure o seu poder o máximo possível. No caso, a
qualidade de raposa é muito apropriada segundo Maquiavel, pois dessa forma o
príncipe precisa de astúcia para saber simular e dissimular, pois nem sempre
cumprirá com a palavra dada a menos que não o prejudique(112).
Mas uma das características que marcam essa
relação na visão do filósofo político é o príncipe aparentar ser algo que ele
não é pois “os homens em geral julgam
mais pelos olhos do que pelas mãos”(113). Na relação governante e povo a
aparência do governante é muito importante para a manutenção do seu poder, ou
seja aparentar possuir determinadas características mesmo não as tendo para a
manutenção de seu poder.
Assim a relação entre ambos ocorre
principalmente através da aparência e do medo.
Considerações Finais
Acreditamos que foi possível esclarecer o
significado e as características do governante, enfatizando-as e apresentando
seu conteúdo, que seria a prática da arte da guerra, usar a maldade de forma
adequada, a parcimônia, e a imposição do medo principalmente garantiria de
certa forma o seu poder.
Percebe-se que na relação colocada que, o
povo sempre está sendo controlado por este poder patriarcal, e dessa forma, a
liberdade do povo está no domínio do governante. Assim, o medo e a passividade
são as coisas principais que ocorrem na relação governante e povo.
Referências
MACHIAVELLI, Nicolò. “O Príncipe”. Trad. Lívio
Xavier. Rio de Janeiro: Edições de Ouro, 1960.
BIGNOTTO,
Newton. “Maquiavel Republicano”. Loyola, São Paulo, 1991.